A Directora do Serviço de Genética e Biologia Forense no Instituto Nacional de Medicina Legal do Porto, Maria Fátima Pinheriro, destaca os avanços inovadores na genética forense fulcrais na resolução de crimes e garante que as séries televisivas, como o CSI se afastam um pouco da realidade. A especialista e professora universitária, autora do recente livro “A Genética Forense”, crítica outros especialistas forenses que “dão pareceres e não têm prática”.
Qual é a importância da perícia e da genética forense em tribunal?
Efectivamente é imprescindível. Fazemos perícias no âmbito da investigação de filiação, criminalística, biológica e identificação genética individual, particularmente restos cadavéricos. A prova irrefutável é efectivamente a prova genética, porque a prova testemunhal que nos pode dar relativamente à paternidade é muito redutora. Em relação à criminalística e biológica é a mesma coisa. Temos um vestígio biológico, por exemplo, colhido no local do crime no corpo da vítima, identificamos um perfil genético e depois a investigação criminal colhe uma amostra biológica de referência a um suspeito e nós comparamos os perfis genéticos.
Esta função da genética forense é mais fulcral hoje em dia que há uma década?
A importância é a mesma só que nós hoje temos meios. Começámos a fazer perícias com base no estudo do ADN a partir de 1992. Até então recorríamos a outros marcadores genéticos menos informativos de que hoje possuímos. O valor em termos probatórios de uma perícia hoje é maior do que há uma década.
Como foi feita essa evolução em relação com a justiça?
Numa fase inicial, na investigação paternal, nós os peritos éramos muitas vezes contactados para ir a tribunal prestar esclarecimentos relativamente ao relatório pericial. Agora, por vezes também somos requisitados, mas penso que isto entrou no dia-a-dia da justiça. Nós fazemos a extracção do ADN, a amplificação, obtemos resultados, comparamos perfis e interpretamos os resultados. Na parte final, elaboramos um relatório pericial que é enviado à entidade requisitante.
Tendo em conta os avanços da genética forense e sabendo que a maior parte dos suspeitos deixam vestígios no local, o “crime perfeito” é hoje mais impossível de conseguir?
Acho que sim, mas também acho que se o suspeito for suficientemente sofisticado pode conseguir não deixar vestígios. Diria pelo menos que hoje é mais difícil. Se não houver vestígios biológicos a genética forense não consegue fazer nada.
Sente que a genética forense em Portugal está ao nível da que é feita na Europa e nos EUA?
Sem dúvida. Temos equipamento e pessoal perfeitamente preparado para se fazer o que se faz lá fora. Conseguimos os mesmos resultados com o mesmo grau de probabilidade, quando se está a falar em casos de filiação. Temos equipamento similar.
Têm equipamento e condições similares?
Estou a falar em equipamento e pessoal perfeitamente capacitado. Em relação às condições logísticas não são efectivamente as mais desejáveis, mas isso não obsta a que não se obtenham os mesmos resultados. Se nos perguntar se gostaríamos de trabalhar noutras condições, se calhar sim.
Enquanto perita sente que o seu contributo é importante para deslindar casos na justiça?
Sem dúvida nenhuma. A nossa função é fundamental. Por exemplo, numa agressão sexual, a identificação de um perfil genético masculino coincidente com o de um suspeito é imprescindível para a conclusão do caso.
Trabalha nesta área desde 1976, já teve casos em que pensou que em ’76 seria impossível deslindar o caso?
Completamente. Até princípios da década de ’90, os resultados que obtínhamos ficavam muito aquém daquilo que conseguimos obter hoje. Em termos de investigação de paternidade conseguimos valores na ordem dos 99,9 por cento. Nas agressões sexuais, na comparação de perfis genéticos, conseguimos também valores muito grandes. É muito gratificante verificar que ao longo dos anos houve uma evolução extraordinária.
Seria possível continuar a fazer investigação criminal com esta qualidade sem o avanço da genética forense?
De maneira nenhuma. O nosso contributo para a investigação criminal é dar indícios de que aquele indivíduo praticou o crime ou excluir. Nós não fazemos investigação criminal. O juiz é que analisa e decide.
Como é que os polícias vêem a genética forense?
A delegação norte do Instituto Nacional de Medicina Legal contacta mais com a PJ e com a GNR. As polícias foram percebendo a evolução da genética forense. A comunicação social começou também a divulgar aspectos ligados ao estudo do ADN e as pessoas começaram a perceberam a evolução e o grande salto.