(Thursday 18th of May 2017)
Base de ADN: Faltam regras para partilhar dados com polícias estrangeiras

Fiscalizador da base de ADN dos condenados com mais de 3 anos de pena teme confusão jurídica com autoridades judiciais europeias. (Read more)

Username
Password
ADN ilegal
Friday 7th of January 2011
Author: Paulo Pinto de Albuquerque
Published in: Diário de Notícias

dn2 As amostras de ADN recolhidas na base de dados do Laboratório da Polícia Científica da Polícia Judiciária de 2002 a 2007 são ilegais. Estas amostras não podem ser usadas em processo penal e terão de ser destruídas. Tal como avisei em 2007, este é o preço a pagar pela inércia do legislador, que não resolveu este problema ao longo de anos.

Trata-se de um preço caro, pois está em causa o trabalho de recolha de duas mil amostras que poderiam ser cruciais para resolver muitos casos envoltos ainda em mistério e evitar condenações erradas.

Com efeito, a nova Lei n.º 5/2008 aprovou a criação de uma base de dados de perfis de ADN para fins de identificação civil e criminal. Contudo, o legislador não resolveu o problema das amostras colhidas pela PJ ao longo de anos e que se mantinham à sua guarda sem qualquer quadro legal para o efeito, designadamente no que res-peita ao modo de conservação e armazenamento desses dados e à segurança da informação. Estas amostras eram colhidas em condenados e em cenários de crimes não resolvidos. Quer num caso quer no outro, estas amostras não poderão ser utilizadas em processo penal, pois foram colhidas e guardadas ao arrepio da lei.

Mas os problemas com a deficiente lei de 2008 não terminam neste ponto. Entre muitos outros problemas, destaco apenas dois. Primeiro, o da utilização das amostras a pedido do arguido em processo penal. Como resulta do artigo 8.º, n.º 1, da Lei n.º 5/2008, o arguido pode solicitar, na pendência do processo criminal, um exame para determinação do seu perfil genético com vista à sua utilização para fins de investigação criminal e, designadamente, para demonstrar a falta de coincidência entre o seu perfil de ADN e o perfil de ADN obtido na amostra problema. Esta é uma concretização das garantias de defesa do artigo 32.º da Constituição. Contudo, o artigo 6.º, n.º 3, da mesma lei contraria frontalmente este direito, pelo que deve ser interpretado em conformidade com a Constituição, no sentido de permitir a utilização, no processo em que o arguido a pediu, da recolha de amostras.

Segundo, o problema da recolha da amostra, após trânsito em julgado, no caso de condenado por crime doloso com pena concreta de prisão igual ou superior a 3 anos, ainda que esta tenha sido substituída. A decisão sobre a recolha da amostra para obtenção de perfil de ADN do condenado e respectiva integração na base de dados de perfis de ADN compete ao juiz de julgamento, na sentença, caso não se tenha procedido à recolha da amostra na pendência do processo. Esta decisão deve ser fundamentada e é recorrível, porque não se trata de um efeito automático da sanção principal. A recolha é um efeito substantivo da sentença condenatória, subordinado ao artigo 29.º, n.º 3, da Constituição, razão pela qual só se aplica aos crimes cometidos depois da entrada em vigor da Lei n.º 5/2008. Ora, a recolha de amostras só é proporcional e necessária se disser respeito a crimes graves punidos com pena efectiva e quando houver "perigo de continuação criminosa" do arguido, tal como decidiu o Tribunal Constitucional alemão em 14-12-2000. É essa a ratio da recolha da amostra. Por isso, é inconstitucional o n.º 2 do artigo 8.º da Lei n.º 5/2008, na medida em que se aplique a arguido condenado pela prática de crime punível com pena de prisão inferior a cinco anos de prisão ou a arguido em relação ao qual se não tenha estabelecido na sentença um perigo de continuação da actividade criminosa e, designadamente, quando se aplique a arguido condenado em pena de prisão com a execução suspensa, porque beneficiou de uma prognose positiva.

All news